O Leitor Como Intérprete (Parte I)
de Gordon D. Fee e Douglas Stuart
A primeira razão por que precisamos aprender como interpretar é que, quer deseje, quer não, todo leitor é ao mesmo tempo um intérprete. ou seja a maioria de nós toma por certo que, enquanto lemos, também entendemos o que lemos. Tendemos, também, a pensar que nosso entendimento é a mesma coisa que a intenção do Espírito Santo ou do autor humano. Apesar disso, invariavelmente levamos para o texto tudo quanto somos, com toda nossa experiência, cultura e entendimento prévio de palavras e idéias. Às vezes, aquilo que levamos para o texto, sem o fazer deliberadamente, nos desencaminha ou nos leva a atribuir ao texto idéias que lhe são estranhas.
Desta maneira, quando uma pessoa em nossa cultura ouve a palavra “cruz”, séculos de arte e simbolismo cristãos levam a maioria das pessoas a pensar automaticamente numa cruz romana(T) embora haja pouca probabilidade de que aquele era o formato da Cruz de Jesus, que provavelmente tinha a forma de um “T”. A maioria dos protestantes, e dos católicos também, quando lê textos acerca da igreja em adoração, automaticamente forma um quadro de pessoas sentadas numa construção com bancos, muito semelhante às deles. Quando Paulo diz: “Nada disponhais para a carne, no tocante às suas concupiscências” (Rm 13.14), as pessoas nas culturas de idiomas europeus tendem a pensar que “a carne” significa “o corpo” e, portanto, que Paulo está falando nos “apetites físicos.” Mas a palavra “carne,” conforme Paulo a emprega, raras vezes se refere ao corpo — e neste texto quase certamente não tem esse sentido — mas, sim, a uma enfermidade espiritual, uma doença de existência espiritual às vezes chamada “a natureza pecaminosa.” O leitor, portanto, sem o fazer deliberadamente, está interpretando o que lê, e, infelizmente, por demais freqüentemente interpreta incorretamente.
Isto nos leva a notar ainda mais arte o leitor de uma Bíblia em idioma latino já está envolvido na interpretação. A tradução, pois, é em si mesma uma forma (necessária) de interpretação. Sua Bíblia, seja qual for a tradução que você empregar, que para você é o ponto de partida, é, na realidade, o resultado final de muito trabalho erudito. Os tradutores são regularmente conclamados a fazer escolhas quanto aos significados, e as escolhas deles irão afetar como você entende.
Os bons tradutores, portanto, levam em consideração as diferenças entre nossos idiomas. Esta, porém, não é uma tarefa fácil. Em Romanos 13.14, por exemplo, devemos traduzir “carne” porque esta é a palavra que Paulo empregou, e depois deixar o intérprete contar-nos que “carne” aqui não significa “corpo”? Ou devemos “ajudar” o leitor e traduzir “natureza pecaminosa” porque é isto que Paulo realmente quer dizer? Retomaremos este assunto com maiores detalhes no capítulo seguinte. Por enquanto, basta indicar que o próprio fato da tradução já envolveu a pessoa na tarefa da interpretação.
[Nas próximas semanas, Deus permitindo, iremos reproduzir nesta seção mais princípios da interpretação dos senhores Fee e Stuart do seu livro “Entendes o Que Lês?”]
Veja a segunda parte deste estudo “OLeitor Como Intérprete Parte 2“
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O livro de Gordon D. Fee e Douglas Stuart do qual este texto foi extraído, “Entendes o que Lês?“, pode ser encomendado daEdições Vida Nova
selecionando a capa do livro ao lado: