Capítulo Três: O Julgamento

de Max Lucado

O julgamento mais famoso da história está a ponto de começar. O juiz é baixinho, mas tem ar de aristocrata, olhar furtivo e roupas finas. Seu cabelo grisalho é bem aparado e seu rosto sem barba. Ele está apreensivo, nervoso por ser empurrado para uma decisão que ele não pode evitar. Dois soldados o conduzem na descida dos degraus de pedra da fortaleza para o pátio maior. Raios de luz solar matutina atravessam o chão de pedra.

Quando ele entra, soldados sírios vestindo togas se apressam para ficar em pé, suas lanças para cima, olhares para a frente. O chão no qual eles estão em pé é um mosaico de pedras marrons, largas e lisas. No chão estão riscados os jogos que os soldados usam para se divertir enquanto esperam a condenação de um prisioneiro.

Mas na presença do procurador, eles não jogam.

Uma cadeira real é colocada numa elevação cinco degraus acima do chão. O magistrado sobe e toma o assento dele. O acusado é trazido para a sala e colocado debaixo dele. Um punhado de líderes religiosos em seus mantos seguem, andam para um lado do quarto, e esperam.

Pilatos olha para a figura solitária.

“Não se parece com um Cristo”, ele murmura.

Pés inchados e barrentos. Mãos bronzeadas. Juntas encaroçadas.

Parece mais com um trabalhador braçal do que um professor. O que menos parece é encrenqueiro.

Um olho está preto, inchado e fechado. O outro olha ao chão. Lábio inferior partido e coberto por uma casca. Cabelo ensangüentado, emaranhado à testa. Braços e coxas riscados com vermelho.

“Quer que removamos o manto”? um soldado pergunta.

“Não. Não é necessário”.

É óbvio o que o açoite fez.

“Você é o rei dos judeus”?

Pela primeira vez, Jesus ergue os olhos. Ele não eleva a cabeça, mas ele ergue os olhos. Ele olha para o procurador por baixo da sobrancelha dele. Pilatos está surpreso com o tom na voz de Jesus.

“Essas são suas palavras.”

Antes que Pilatos possa responder, o nó de líderes judeus escarnecem o acusado do lado do tribunal.

“Veja como ele não tem nenhum respeito.”

“Ele incita as pessoas”!

“Ele se diz ser rei”!

Pilatos não os ouve. “Essas são suas palavras.” Nenhuma defesa. Nenhuma explicação. Nenhum pânico. O Galileu está olhando novamente para o chão.

Pilatos olha para os líderes judeus grudados um no outro no canto do tribunal. A insistência deles o chateia. Não bastam as chicotadas. O escárnio é insuficiente. Ciumentos, ele quer dizer na cara deles, mas não faz. Urubus Ciumentos, o bando obstinado inteiro de vocês. Matando seus próprios profetas.

Pilatos quer soltar Jesus. Dê-me apenas uma razão, ele pensa, quase em voz alta. Eu lhe soltarei.

Os pensamentos dele estão interrompidos por um toque no ombro. Um mensageiro se abaixa e sussurra. Estranho. A esposa de Pilatos disse para ele não se envolver no caso. Algo sobre um sonho que ela teve.

Pilatos anda por trás da cadeira dele, senta, e olha fixamente para Jesus. “Até mesmo os deuses estão de seu lado”? ele declara sem explicação.

Ele já sentou nesta cadeira antes. É uma cadeira curul (reservada ao uso das mais altas autoridades): azul de cobalto com pernas grossas e ornamentadas. O assento tradicional de decisão. Sentando nele Pilatos transforma qualquer sala ou rua numa sala de tribunal. É daqui que ele faz as decisões dele.

Quantas vezes ele já sentou aqui? Quantas histórias já ouviu? Quantos argumentos ele já recebeu? Quantos olhos largos o encararam, rogando por clemência, mendigando uma absolvição?

Mas os olhos deste Nazareno estão tranqüilos, silenciosos. Eles não gritam. Eles não correm. Pilatos os examina, procurando ansiedade. . . procurando raiva. Ele não encontra. O que ele descobre o faz mexer novamente.

Ele não está bravo comigo. Ele não tem nenhum medo. . . ele parece entender.

Pilatos está certo na observação dele. Jesus não tem medo. Ele não está bravo. Ele não está à beira de pânico. Porque ele não está surpreso. Jesus conhece a hora dele e a hora chegou.

Pilatos tem motivo para sua curiosidade. Onde estão os seguidores dele, se é que ele é um líder? O que ele pretende fazer, se ele é um Messias? Por que os líderes religiosos estão tão bravos com ele, se ele é um professor?

Pilatos também está correto na pergunta dele. “O que eu deveria fazer com Jesus, chamado o Cristo?” (Mat 27:22)

Talvez você, como Pilatos, está curioso sobre este homem chamado Jesus. Você, como Pilatos, está confuso com suas declarações e mexido com suas paixões. Você ouviu as histórias: Deus descendo as estrelas, encarnando, colocando uma estaca de verdade no globo. Você, como Pilatos, ouviu os outros falarem; agora você gostaria que ele falasse.

O que você faz com um homem que declara ser Deus, mas que odeia religião? O que você faz com um homem que se chama o Salvador, mas que condena sistemas? O que você faz com um homem que conhece o lugar e hora da sua morte, contudo vai lá de qualquer maneira?

A pergunta de Pilatos é sua. “O que farei eu com este homem, Jesus?”

Você tem duas escolhas.

Você pode rejeitá-lo. Isso é uma opção. Você pode, como muitos têm feito, decidir que a idéia de Deus se tornar um carpinteiro é estranha demais – e cair fora.

Ou você pode aceitá-lo. Você pode viajar com ele. Você pode escutar a voz dele entre centenas de outras vozes e segui-lo. Pilatos poderia ter feito isso. Ele ouviu muitas vozes naquele dia – ele poderia ter ouvido a Cristo. Se Pilatos escolhido tivesse escolhido responder ao Messias machucado, a história dele teria sido diferente.

Pilatos vacila. Ele é um cachorrinho ouvindo duas vozes. Ele anda em direção a um, então pára, e anda em direção à outra. Quatro vezes ele tenta livrar o Jesus, e quatro vezes ele balança para o outro lado. Ele tenta dar Barrabás para as pessoas; mas eles querem Jesus. Ele envia Jesus ao poste de chicoteamento; eles querem que ele seja mandado para o Gólgota. Ele declara que não acha nada de errado com este homem; eles acusam Pilatos de violar a lei. Pilatos, temendo quem Jesus poderia ser, tenta libertá-lo uma última vez; os judeus o acusam de trair César.

Tantas vozes. A voz do acordo. A voz da conveniência. A voz da política. A voz da consciência.

E a voz firme e branda de Cristo. “O único poder que você tem sobre mim é o poder dado a você por Deus”. (João 18:34)

A voz de Jesus é distinta. Sem igual. Ele não bajula, nem implora. Ele só declara o caso.

Pilatos pensou que ele poderia evitar fazer uma escolha. Ele lavou as mãos dele em relação a Jesus. Ele subiu na cerca e se sentou.

Mas, ao não fazer uma escolha, Pilatos fez uma escolha.

Em lugar de pedir a graça de Deus, ele pediu um uivo. Em lugar de convidar Jesus a ficar, ele o despachou. Em lugar de ouvir a voz de Cristo, ele ouviu a voz das pessoas.

Diz a lenda que a esposa de Pilatos se tornou uma crente. Diz a lenda que a casa eterna de Pilatos é um lago numa montanha onde ele vem à superfície diariamente, ainda mergulhando suas mãos na água em busca de perdão. Sempre tentando lavar a culpa dele . . . não do mal que ele fez, mas da bondade que ele não fez.



Veja também de Max Lucado: “No Cenáculo” e “No Jardim”.

Este artigo foi traduzido por Dennis Downing e reproduzido com a devida autorização do autor para o site www.hermeneutica.com.

Copyright © 1996 Max Lucado e UpWords Ministries. Todos os direitos reservados.

Para mais meditações de Max Lucado visite o site www.maxlucado.com.br

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